A tempestade
Profeta escarnecido pelas turbas
Disse-lhes rindo — adeus!
Vim adorar na serrania escura
A sombra de meu Deus!
O céu enegreceu: lá no ocidente
Rubro o sol se apagou;
E galopa o corcel da tempestade
Nas nuvens que rasgou...
Da gruta negra a catarata rola,
Alaga a serra bronca,
Esbarra pelo abismo, escuma uivando
E pelas trevas ronca...
O chão nu e escarvado p'las torrentes
Trêmulo se fendeu...
Da serrania a lomba escaveirada
O raio enegreceu.
Cede a floresta ao arquejar fremente
Do rijo temporal,
Ribomba e rola o raio, nos abismos
Sibila o vendaval.
Nas trevas o relâmpago fascina,
A selva se incendeia...
Chuva de fogo pelas serras hirtas
Fantástica serpeia...
Amo a voz da tempestade,
Porque agita o coração...
E o espírito inflamado
Abre as asas no trovão!
A minh'alma se devora
Na vida morta e tranqüila...
Quero sentir emoções,
Ver o raio que vacila!
Enquanto as raças medrosas
Banham de prantos o chão,
Eu quero erguer-me na treva,
Saudar glorioso trovão!
Jeová! derrama em chuva
Os teus raios incendidos!
Tua voz na tempestade
Reboa nos meus ouvidos!
É quando as nuvens ribombam
E a selva medonha está,
Que no relâmpago surge
A face de Jeová!
A tuba da tempestade
Rouqueja nos longos céus,
De joelhos na montanha
Espero agora meu Deus!
O caminho rasgou-se: mil torrentes
Rebentam bravejando,
Rodam na espuma as rochas gigantescas
Pelo abismo tombando.
Como em noite do caos, os elementos
incandescentes lutam.
Negra — a terra, o céu — rubro, o mar — vozeia
— E as florestas escutam...
Tudo se escureceu e pela treva,
No chão sem sepultura,
Os mortos se revolvem tiritando
Na longa noite escura.
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